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sexta-feira, 23 de maio de 2008

O embargo injustificável

A União Européia não hesita em aplicar sanções a Cuba em função de medidas repressivas que são previstas por todos os seus Estados membros. Bruxelas não admite a evidência de que, diante do assédio dos EUA, Havana exerceu um direito de legítima defesa
René Vásquez Díaz

Embora sejam deploráveis as penas infligidas a opositores não violentos, ninguém pode negar que os dissidentes eram financiados pelos EUA
A prisão em Cuba e a condenação a pesadas penas, no dia 15 de março de 2003, de cerca de sessenta dissidentes, cuja dependência financeira em relação a agências norte-americanas foi comprovada, vieram evidenciar o caráter irracional das relações entre Washington e Havana. Envolvendo-se nelas sem estar diretamente implicada, a União Européia perdeu o sangue frio e corre o risco de ser, ela própria, abocanhada pela irracionalidade e pela paixão que caracterizam, com freqüência, o tratamento da questão cubana. Tudo isso às expensas da maioria dos cidadãos cubanos, principais vítimas das sanções adotadas.


Embora seja necessário deplorar as penas infligidas a opositores não violentos, ninguém pode negar que as pessoas condenadas recebiam dos Estados Unidos, de modo regular e sob a forma de “subvenção” ou de “ajuda”, quantias em dólares. Nem que, através de suas provocações e de sua atitude desafiadora, o representante de Washington em Havana, James C. Cason1 , amigo pessoal de George W. Bush, queimou seus “recrutas”. Talvez deliberadamente.

Dinheiro americano
Meios de comunicação constituem uma verdadeira rede multimídia, dedicada de corpo e alma à estratégia anticubana de Washington
Diante da proibição de subvencionar pessoas ou organizações que tenham por objetivo promover atividades políticas visando a perturbar a ordem interna de um Estado, James Cason, sigilosamente e desde sua chegada a Havana, em setembro de 2002, deu início a missões de financiamento e de apoio logístico aos dissidentes internos, por intermédio de malas diplomáticas ou de emissários mais ou menos discretos. As autoridades cubanas tomaram conhecimento desse tráfico desde o começo, graças a seus agentes infiltrados, e o toleravam. Velhos opositores vivem, há anos, dessa “ajuda internacional”, e alguns deles representam, em virtude desse maná econômico providencial, o que muitos cubanos chamam de uma “oposição de fachada”.

Com o objetivo de incentivar a desestabilização de Cuba, a rede constituída pela Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (Usaid) e pela National Endowment for Democracy (Fundação Nacional para a Democracia) - organizações criadas para realizar abertamente o que a Agência Central de Informações (CIA) pratica secretamente - concentra grandes somas de dinheiro.

Em 2000, por exemplo, dispunham de 8,24 milhões de dólares, um montante que se distribuía do seguinte modo: 2 132 000 para “planejar a transição” de Cuba; 670 mil para “a publicação, no exterior, de obras de jornalistas cubanos independentes”; 1,6 milhão para a criação, em Cuba, de “ONGs independentes”; 335 mil para garantir o “bom andamento do programa de desestabilização”; 2,3 milhões para recolher e divulgar, no exterior, informações sobre as organizações de defesa dos direitos humanos; 1,2 milhão para a Rede de Apoio à Dissidência, formada, entre outros, pela Rádio“Martí”, Televisão “Martí”, revista Encuentro (editada em Madri), Cubanet e por outros meios de comunicação que, reunidos, constituem uma verdadeira rede multimídia, dedicada de corpo e alma à estratégia anticubana de Washington.

Estratégia de mídia
Emissoras de televisão norte-americanas, retransmitidas por emissoras cubanas instaladas na Flórida, divulgam para a ilha, semanalmente, 2.200 horas de programas em 24 freqüências. Mas como esse bombardeio de propaganda não é suficiente, um avião Hércules C-130 da Força Aérea Norte-americana, no dia 20 de maio de 2003, sobrevoou o território cubano para transmitir os programas da Televisão “Martí” violando, assim, o regulamento da União Internacional de Telecomunicações e pirateando o canal 13 da televisão da ilha.

Uma imagem de coragem fantástica: a liberdade de informação chegando a Cuba a bordo de um bombardeiro pertencente a um exército que, ao longo da história cubana, foi principalmente um exército de ocupação...

Em muitos países democráticos, a legislação proíbe a doação de dinheiro por parte de entidades ou pessoas estrangeiras para o financiamento de campanhas eleitorais (e, sem dúvida, também para contas pessoais dos candidatos). A questão é simples: será que um candidato, que teve sua campanha eleitoral financiada por uma potência estrangeira ou por intermediários dessa potência, poderá, após eleito, realizar seu programa com total independência?

Legítima defesa
Muitos países democráticos têm leis que proíbem doação em dinheiro de entidades e pessoas estrangeiras para fins políticos
Na França, a título de exemplo, o Código Penal em seu livro IV (Dos crimes e delitos contra a nação, o Estado e a paz pública), capítulo I, “Da traição e da espionagem”, seção 2, “Da cumplicidade com uma potência estrangeira” (art. 411-4), define as penas previstas: “O fato de manter entendimentos com uma potência estrangeira, com uma empresa ou organização estrangeira ou sob controle estrangeiro, ou com seus agentes, em vista de suscitar hostilidades ou atos de agressão contra a França, é punido com trinta anos de prisão e com a multa de 3 milhões de francos (457.347 de euros, ou 1,67 bilhão de reais).”

Por sua vez, a muito democrática Suécia, meu país de adoção e pátria de minhas filhas, condena a uma pena máxima de dois anos de prisão (Código Penal, capítulo 19, artigo 13, “Sobre os delitos contra a segurança do Estado”) “aquele que recebe dinheiro ou outras doações de uma potência estrangeira, ou de qualquer pessoa agindo no interesse dessa potência, a fim de publicar ou divulgar textos escritos, ou de influenciar, de um modo ou de outro, a opinião pública no que diz respeito à organização interna do Estado”. A Suécia pune igualmente (art. 8): “Aquele que divulga ou transmite para potências estrangeiras ou para seus agentes informações inexatas ou tendenciosas, com a finalidade de criar ameaças à segurança do Estado”. E, como crime de alta traição, a pacífica Suécia pune com dez anos de prisão ou com prisão perpétua “aquele que constitui uma ameaça à segurança do Estado por haver utilizado meios ilegais com o apoio de uma potência estrangeira”.

No entanto, a União Européia não hesitou em aplicar sanções a Cuba em função de medidas repressivas – certamente odiosas e condenáveis - previstas por todos os seus Estados membros em suas próprias legislações... A pretexto de que a Revolução Cubana não agrada a Washington, Bruxelas se recusa a admitir uma evidência: que, diante daquilo que deve ser chamado de assédio dos Estados Unidos, Havana exerceu um direito de legítima defesa.

O grande erro das sanções
Ao adotar sanções contra Cuba sem mencionar o contexto de guerra latente que essa ilha suporta há 45 anos, a União Européia comete um erro
Será que a União Européia pensa que, punindo 11 milhões de cubanos, as mudanças democráticas poderão se acelerar na ilha? Por que a União aplica com tanto rigor, contra Cuba e seus habitantes, sanções que se recusa a impor aos Estados que não respeitam a legalidade internacional como, por exemplo, os Estados Unidos e Israel? Tal posição é contraproducente porque, para a maioria dos cidadãos cubanos, as sanções têm conseqüências nefastas e se traduzem por mais penúria e mais dificuldades em sua vida cotidiana.

Será que a Europa imagina que a Fundação Nacional Americano-cubana2 , sediada em Miami, não está implicada nas ações terroristas perpetradas em território cubano e que provocaram, em quarenta anos, mais de 2 mil mortos e dezenas de milhares de feridos? Ou será que pensa que contribuir para a aplicação da lei Helms-Burton3 “não importa de que maneira nem por qual motivo” é um ato lícito? Em aplicação a essa lei, aviões cubanos seqüestrados por piratas do ar, na primavera de 2003 – um DC-3 e um Antonov-24 –, foram vendidos em leilões na Flórida. Por que a União Européia não protestou diante de tais abusos contrários às leis internacionais?

Ao adotar sanções contra Cuba sem mencionar o contexto de guerra latente que essa ilha suporta há 45 anos, a União Européia comete um erro. Porque, a despeito da abominação que constitui a condenação de dissidentes a pesadas penas, o governo de Havana, no caso em questão, está dizendo a verdade.

Política da neurose
É necessário fazer com que os Estados Unidos acabem com o embargo comercial imposto à ilha, condenado pela ONU
Os Estados Unidos incluíram Cuba na lista dos “países que financiam o terrorismo” – não porque podem apresentar uma prova mínima dessa alegação, mas “simplesmente porque Cuba faz parte dessa lista”, segundo a explicação estarrecedora dada, em maio de 2003, por Cofer J. Black, coordenador, no Departamento de Estado, da luta contra o terrorismo4 .

Com as recentes sanções do Acordo de Birmingham, assinado em 1998, segundo o qual Bruxelas aceita tacitamente o conteúdo da lei Helms-Burton – lei que decorre da neurose obsessiva que substitui a legislação cubana pela norte-americana e, portanto, deverá provocar, na Cuba pós-castrista, ferozes lutas fratricidas -, a União Européia admite a legalidade de qualquer agressão arbitrária dos Estados Unidos contra Cuba.

O problema humanitário envolvendo os dissidentes presos, vítimas crédulas persuadidas de que a impunidade de que gozam os Estados Unidos garantiria a impunidade deles, deve ser acertado com urgência. Nessa ótica, é vital acabar com o isolamento de Cuba. Não valeria mais a pena abrir espaços de negociação ao invés de os bloquear? É necessário fazer com que os Estados Unidos acabem com o embargo comercial imposto à ilha (e que as Nações Unidas condenam) e que renunciem a essa máquina de guerra que representa a lei Helms-Burton.

Obsessão e neurose
A União Européia deveria trabalhar pela criação de uma oposição livre de qualquer ingerência norte-americana
A adesão de Madri à doutrina ilegal norte-americana é um ponto particularmente doloroso. Dentro da União Européia, o governo espanhol de José Maria Aznar agiu de modo imprudente contra uma população cubana já prostrada. Ele pretende estar de posse de um certo número de soluções para os problemas da ilha. Mas todas são destituídas de referência histórica. Que pensar do problema colocado por James G. Blight e Peter Kornbluh desde 1998, em seu livro Politics of illusion 5 ? Nessa surpreendente coletânea de testemunhos e de discussões durante um simpósio entre altos funcionários da CIA e do governo norte-americano (Arthur Schlesinger Jr. e Jacob L. Esterline, dentre outros) e alguns dissidentes cubanos da década de 60, chega-se à conclusão de que, para os Estados Unidos, em 1959, “perder Cuba - que, na prática, era uma colônia ou um protetorado, mais próxima de Washington DC que Dallas ou Los Angeles - foi um trauma comparável ao que teria representado a perda de Cabo Cod ou de Miami Beach”.

O choque provocado por tal perda transformou-se numa obsessão punitiva crônica contra o povo cubano. A história dirá se essa hostilidade contaminou, enfim, a União Européia, ou se esta, contra a opinião de seus cidadãos, foi obrigada a isso por Washington.

O contrário da verdade, afirmava o grande cientista dinamarquês Niels Bohr, não é a mentira, mas, sim, uma outra verdade. Para Cuba, é urgente livrar-se dos entraves totalitários que freiam o desabrochar das forças vivas da nação. Para isso, é indispensável abolir a síndrome de ilha sitiada, de modo a que um clima de paz possa, enfim, se instaurar. Mais que aplicar sanções sem refletir, a União Européia deveria trabalhar, no interior da ilha, pela criação de uma oposição livre de qualquer ingerência norte-americana. É a única maneira de criar, com moderação e a partir do núcleo da Revolução, um contexto favorável a uma abertura progressiva do regime. Sem banhos de sangue.

(Trad.: Iraci D. Poleti)

1 - Ler sua biografia oficial no site: http://www.state.gov/r/pa/ei/biog/15149.htm
2 - Fundada em 1981, sob o governo Reagan, por Jorge Mas Canosa, ex-cúmplice do ditador Batista, a Fundação Nacional Americano-cubana constitui o núcleo duro do poderoso lobby anticubano em Washington. Ela financia inúmeras atividades visando à derrubada do regime cubano e foi acusada, com freqüência, de patrocinar ações terroristas na ilha e atentados contra Fidel Castro. Consultar: http://www.injusticia_en_miami.cubaweb.cu/resenas/f-k.htm
3 - No dia 12 de março de 1996, o Congresso dos Estados Unidos aprovou uma lei apresentada pelo senador Jesse Helms e pelo representante Dan Burton, chamada de “lei Helms-Burton”, que visa a defender o direito das pessoas e das empresas expropriadas pela Revolução Cubana depois de 1959, e que estabelece sanções contra todos aqueles que, no mundo inteiro, têm relações comerciais com Cuba.
4 - Sete países estão na lista dos “Estados terroristas” feita por Washington: Cuba, Irã, Iraque, Líbia, Coréia do Norte, Sudão e Síria.
5 - Ler, de James G. Blight e Peter Kornbluh (org.), Politics of Illusion: The Bay of Pigs Invasion Reexamined, ed. Lynne Rienner publishers, Boulder, Colorado, Estados Unidos, 1998.


FONTE: LE MONDE

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