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sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

Tribunais e jornalistas nos Estados Unidos da América: perguntas freqüentes

Peter J. Messitte
JUIZ DA VARA FEDERAL PARA O ESTADO DE MARYLAND; PRESIDENTE DO GRUPO DE
TRABALHO PARA A AMÉRICA LATINA E CARIBE, DO COMITÊ DE RELAÇÕES JURÍDICAS
INTERNACIONAIS, DA “JUDICIAL CONFERENCE OF THE UNITED STATES OF AMERICA”

SUMÁRIO: 1) Genericamente, como os tribunais e
os jornalistas se relacionam nos Estados Unidos? - 2)
Qual a liberdade da mídia nos Estados Unidos? - 3)
Como a mídia nos Estados Unidos se refere tanto aos
funcionários públicos, às vezes de maneira falsa, e não
é punida? - 4) Quão freqüentes são as ações contra a
imprensa por difamação ou por invasão de privacidade
e como são as sentenças? - 5) Finalizando, qual o
grau de facilidade que a mídia tem para obter informações
do Judiciário?

1) Genericamente, como os tribunais e os jornalistas
1) se relacionam nos Estados Unidos?
maioria dos juízes e dos jornalistas concordaria que eles se dão bem.
Os juízes entendem que a função dos jornalistas é a de informar o
público sobre assuntos de interesse público. Os jornalistas entendem
que os juízes são responsáveis pela solução de litígios entre os membros
da comunidade de acordo com regras estabelecidas.
A
* Palestra no Seminário da Sociedade Interamericana de Prensa - SIP - São Paulo, 28/08/2003.
Revista da Escola Paulista da Magistratura, ano 4, nº 2, p. 209-219, julho/dezembro - 2003



A maioria dos juízes e dos jornalistas concordaria que eles se dão bem.
Os juízes entendem que a função dos jornalistas é a de informar o
público sobre assuntos de interesse público. Os jornalistas entendem
que os juízes são responsáveis pela solução de litígios entre os membros
da comunidade de acordo com regras estabelecidas.



As duas profissões também compreendem que seus interesses podem às
vezes entrar em conflito. Os juízes sabem que, na sua procura por informação,
os jornalistas podem fazer coisas que afetam os interesses de outros. O
Direito à intimidade pode ser invadido. Informações podem ser veiculadas
de maneira que causem danos à reputação ou à dignidade de outrem. Os
jornalistas podem, às vezes, achar que as leis e os tribunais são muito restritivos.
Eles podem achar que pode ser demasiadamente fácil processá-los
por atos ilícitos durante o procedimento de obtenção de notícias, por violação
do direito à privacidade. Eles acreditam que tais atos, ou mesmo a
mera ameaça deles, possam atrapalhar uma boa investigação jornalística.
Os jornalistas também se sentem como alvo quando processados por uma
notícia que publicaram. E, por fim, eles podem acreditar que os tribunais,
com freqüência, hesitam em proporcionar o acesso às informações sobre os
processos judiciais.
No entanto, os tribunais e os jornalistas, nos Estados Unidos, convivem
de maneira amigável, e isto é, em parte, justificado pela tradição.
Mas os tribunais e os jornalistas também encontraram maneiras de
manter uma linha de comunicação aberta a fim de minimizar suas diferenças.
Alguns tribunais, especialmente tribunais federais e estaduais
de segunda instância, têm assessores de imprensa que, rotineiramente,
informam à imprensa o andamento das atividades dos tribunais. Cópias
de sentenças são rapidamente fornecidas aos repórteres. Juízes e jornalistas,
muitas vezes, se reúnem em seminários para discutir problemas
comuns.
Há, no entanto, certas limitações nas relações entre os juízes e jornalistas.
Tanto o Judiciário federal quanto o estadual têm códigos de conduta
que proíbem os juízes de comentar publicamente o mérito de questões
em andamento, ou em potencial. Um juiz de primeira instância que ignore
essas restrições pode ser severamente advertido por um Tribunal
Superior. Por outro lado, aos juízes é permitido, por esses códigos de
conduta, se engajarem em atividades de instrução, e isso, obviamente, se
estende à instrução da mídia. Como repórteres que comparecem às cortes,
especialmente os mais novos, podem não estar familiarizados com o
protocolo de um foro, muitos acreditam que os juízes têm a responsabilidade
de instruí-los a respeito. Ao mesmo tempo, os juízes devem ser
sensíveis às preocupações dos repórteres, tais como a precisão nas notícias
e seus prazos.
PETER J. MESSITTE
Revista da Escola Paulista da Magistratura, ano 4, nº 2, p. 209-219, julho/dezembro - 2003
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2) Qual a liberdade da mídia nos Estados Unidos?
A liberdade de expressão nos Estados Unidos é muito extensa. Desde a
adoção da Declaração de Direitos da Constituição (Bill of Rights) americana,
em 1791, a Primeira Emenda estabeleceu, entre outras coisas, que o “Congresso
não aprovará nenhuma lei ... limitando a liberdade de expressão ou de
imprensa”. Esse grande princípio legal foi grandemente expandido, de acordo
com o método jurisprudencial da common law, para ser aplicável a todas as
leis ou decretos emanados de qualquer agência governamental, federal ou
estadual.
Em primeiro lugar, nem jornais e periódicos, nem jornalistas precisam
de licença nos Estados Unidos. Como matéria constitucional, eles são livres
para iniciar e para terminar suas operações como desejarem (licenças para
estações de rádio e televisão são, no entanto, concedidas por agências governamentais).
Censura prévia da imprensa também é inconstitucional, e mesmo
que teoricamente possível, ocorre com muito pouca freqüência. Somente em
casos extremos, de dano direto, imediato e irreparável à nação ou ao seu povo,
tal censura seria permitida, mas, na maioria dos casos que chegaram aos tribunais,
essa censura não foi permitida (no entanto, se a expressão vier a ser
considerada ilegal, ela poderá ser punida). O leading case nesse sentido é o
New York Times Company vs. United States, decidido pela Suprema Corte dos
Estados Unidos em 1971. Nesse caso, o governo federal fez esforços para
bloquear a publicação de documentos do Pentágono que envolviam assuntos
sigilosos relacionados à história e às condutas na Guerra do Vietnã, que ainda
estava em andamento, e tal pedido foi indeferido.
A idéia de que o governo possa fechar um jornal por algo publicado seria
algo sem precedentes.
Os jornalistas não podem, é óbvio, cometer um crime para a obtenção de
notícias, tal como arrombar uma casa ou um escritório de alguém e roubar
documentos, nem podem cometer uma agressão. Por outro lado, praticamente
não há responsabilidade penal se um repórter estiver envolvido em uma
invasão de privacidade não forçada, ou se publicar material de natureza difamatória.
(“Difamação”, nos Estados Unidos, se refere à imputação de crime,
assim como fatos injuriosos à reputação e à honra. Não há categorias separadas
de ofensa denominadas “calúnia” ou “injúria”.) A responsabilidade para
tais atos é inteiramente de natureza civil, isto é, o ofensor responde somente
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em forma de danos financeiros. Raramente se propõe uma medida cautelar e,
mais raramente, é concedida uma liminar por existir proibição constitucional
contra restrição da imprensa.
Quanto ao que publicam, os jornalistas têm grande latitude no que diz
respeito a informações sobre pessoas de conhecimento público, mas, mesmo
em relação a estas, e certamente às pessoas que não são de conhecimento
público, há circunstâncias em que eles possam ter de responder por danos
materiais por publicações falsas. (Mais adiante, retomaremos esse assunto.)
A verdade, entretanto, é sempre uma defesa em qualquer ação de difamação.
Nenhuma exceção é feita por difamação dirigida a qualquer indivíduo,
seja ele Presidente dos Estados Unidos da América, presidente do Senado,
líder da Câmara dos Deputados, ou membro da Suprema Corte. A única
pena por difamação (o que, novamente, pressupõe falsidade) é uma indenização
financeira à vítima.
Quando se trata do direito à privacidade, o direito à liberdade de imprensa
geralmente tem prioridade. Quando figuras públicas estão envolvidas,
a sua zona de privacidade é extremamente pequena, se existente. O Presidente
Bill Clinton descobriu isso quando sua relação com a sua estagiária Mônica
Lewinski tornou-se um assunto de interesse público, e foi a base para um
esforço para retirá-lo do cargo.
Mas, como será visto adiante, existe pelo menos um direito à privacidade
que até um Presidente poderia exigir, isto é, quando sua imagem for usada
sem sua permissão na publicidade de produtos.
O direito à privacidade dos indivíduos é mais protegido do que o das
figuras públicas, mas, mesmo assim, em vários casos, é possível argumentar
que as atividades desses indivíduos são suficientemente de interesse à imprensa
a ponto de tornar inviável uma ação por invasão de privacidade.
3) Como a mídia nos Estados Unidos se refere tanto a funcionários
3) públicos, às vezes de maneira falsa, e não é punida?
Algumas palavras sobre a estrutura do Direito e dos tribunais americanos
podem inicialmente ser úteis.
Os Estados Unidos são um sistema federalista, com um governo central
e 50 Estados independentes. O governo federal tem a responsabilidade de
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regular as atividades nacionais e internacionais, tais como imposto de renda
ou lei de imigração, ou crimes de natureza nacional ou interestadual. O Congresso
Federal também estabeleceu certas questões civis como de natureza
federal, como as de discriminação no emprego ou as de violação de direitos
civis. Mas a grande maioria dos crimes do dia-a-dia e questões de direito civil
são definidos e regulados mais pelos Estados do que pelo governo federal. Em
teoria, então, há 50 diferentes conjuntos de leis, civis e criminais, entre os 50
Estados, mas, na prática, há geralmente poucas variações entre os Estados e
uma determinada questão.
Uma última palavra em termos de perspectiva:
O conceito do precedente vinculante é parte essencial do sistema da Common
Law. Isso significa que, quando um Tribunal de Apelação de um sistema
judiciário (seja ele Tribunal Federal de Apelação, incluindo a Suprema Corte
Americana, interpretando a legislação federal, seja um Tribunal de Apelação
Estadual, interpretando a legislação estadual) chega a uma decisão, essa decisão
torna-se obrigatória para as cortes inferiores do mesmo sistema nos casos
subseqüentes de mesma natureza. Em outras palavras, a decisão do tribunal
torna-se parte do Direito. Dessa forma, para um juiz ou um advogado conhecer
o Direito Constitucional americano, ele deve conhecer o que a Constituição,
as leis e a jurisprudência dizem. Isso deve ser levado em consideração na
resposta a esta questão.
Antes de 1962, para uma publicação de um jornal ser considerada
difamatória, dependia da legislação de um determinado Estado. Todos os
Estados americanos tinham, naquela época (e ainda têm hoje), leis que
definem difamação. De uma maneira geral, difamação significava publicação
de falsa informação injuriosa sobre a reputação de alguém, de maneira
negligente, isto é, sem o cuidado usual. Mas, em 1962, a Suprema Corte
decidiu o caso New York Times vs. Sullivan, com base na Primeira Emenda
Constitucional, e, imediatamente, se tornou obrigatória a todas as demais
cortes federais ou estaduais. O tribunal decidiu que, quando está envolvida
uma figura pública, a mídia não será responsável por danos civis, mesmo
por publicação de informações falsas, desde que a informação não tenha
sido veiculada com o conhecimento de sua falsidade, ou com grosseiro desconhecimento
da verdade. É o conhecido padrão do actual malice, i.e.,
efetiva má-fé. Por um princípio constitucional, não há responsabilidade
civil se a mídia foi simplesmente negligente nas informações que publicou
sobre figuras públicas.
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No mesmo caso, a Suprema Corte decidiu que o autor deveria provar seu
caso, não por simples preponderância das provas, mas “com clareza convincente”.
Em 1974, a Suprema Corte americana decidiu o caso Gertz vs. Robert
Welch, Inc., em que a pessoa difamada não era uma figura pública. O tribunal
decidiu que a Primeira Emenda Constitucional não necessariamente proibia
um Estado de adotar negligência comum como um padrão para impor responsabilidade
à mídia por difamação. Mas o tribunal também permitiu que
um Estado pudesse optar por um padrão mais rigoroso, inclusive o padrão da
negligência grosseira, e até o padrão da efetiva má-fé, similar ao aplicado nos
casos envolvendo figuras públicas.
Por outro lado, a Suprema Corte também decidiu no caso Gertz que, se a
responsabilidade fosse imposta na base de negligência ou negligência grosseira,
em vez da efetiva má-fé, a indenização seria limitada à compensação pelo
prejuízo real comprovado causado pela difamação. Danos presumidos e punitivos
não seriam concedidos.
4) Quão freqüentes são as ações contra a imprensa por difamação
4) ou por invasão de privacidade e como são as sentenças?
O ponto a ser enfatizado é que processo criminal por difamação ou por
invasão de privacidade não forçada não existe nos Estados Unidos. A responsabilidade
por difamação é exclusivamente civil por natureza, isto é, envolve
apenas indenização financeira. Não há, por exemplo, nenhuma lei que garanta
o direito de resposta. A responsabilidade por invasão de privacidade também
é exclusivamente de natureza civil, embora, além de indenização financeira,
às vezes, seja concedida uma ordem judicial contra futuras violações.
Embora processos por difamação e invasão de privacidade sejam ocasionalmente
propostas contra a imprensa, eles não podem ser caracterizados
como freqüentes. Ações propostas por funcionários públicos, assim como por
executivos eleitos, legisladores, ou juízes, certamente não o são. Ações propostas
por indivíduos contra a mídia, embora mais freqüentes, ainda não são
numerosas.
Todas as ações são instituídas de acordo com a lei do Estado onde o ato
alegado teria ocorrido. Não há legislação federal sobre difamação ou invasão
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de privacidade. Assim, não só os elementos da ação são definidos por lei estadual,
mas também a proporção das indenizações.
Apesar de cada um dos 50 Estados ter sua própria legislação sobre difamação,
os elementos da ação tendem a ser os mesmos. Uma afirmação é considerada
difamatória, se for óbvia (isto é, referir-se a alguém como “ladrão”,
“safado”, “assassino”), ou deve ser como tal entendida em relação à época e à
posição profissional da vítima (por exemplo, chamar alguém de gay nos dias
de hoje é difamação?). A afirmação deve ter sido publicada, isto é, deve ser
notada por outros além da pessoa difamada; a vítima deve ser claramente
identificável; e, em certos casos, a vítima deve provar que sofreu danos pecuniários
ou econômicos.
As legislações estaduais também definem quais tipos de danos são indenizáveis
pela difamação. Mais uma vez, mesmo existindo 50 diferentes Estados,
suas leis nesse sentido são, substancialmente, similares. Caso alguém
prove a existência de certos tipos de difamação — isto é, imputação falsa de
crime, de uma doença perigosa ou injúria a um negócio, comércio ou profissão
— fica presumido, sem necessidade de prova, que houve dano material
substancial. Outras palavras difamatórias serão causa de pedir apenas se houver
prova de dano efetivo, como, por exemplo, perda de clientela ou de um
contrato, e não somente da perda de amigos ou colegas, ou não somente
sofrimento mental ou doença decorrente da difamação.
Em determinadas circunstâncias, além da indenização por dano presumido
ou efetivo, o autor pode ter direito à indenização punitiva, isto é, indenização
concedida contra o ofensor a fim de puni-lo e de desestimulá-lo (e a
outros) de uma possível reincidência.
Mais informações sobre a indenização de caráter punitivo serão dadas
adiante, mas, antes, algumas informações sobre ações contra a mídia por invasão
de privacidade.
Novamente, apesar da soberania das 50 jurisdições diferentes, cada Estado
reconhece formas mais ou menos similares de causas de pedir. Como resumido
pelo professor William Prosser, um grande autor em Direito da Responsabilidade
Civil, a invasão de privacidade tem quatro variações básicas:
1) apropriação comercial do nome de outrem ou similar;
2) intrusão não-razoável na privacidade de outrem (por exemplo, bisbilhotagem);
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3) publicidade de maneira não razoável que coloque outrem de maneira
falsa (não necessariamente difamatória) frente ao público (por exemplo, um
republicano de longa data ser chamado de democrata); e
4) publicidade sobre a vida privada de outrem (por exemplo, uma publicação
verdadeira de que a autora fora uma prostituta).
A extensão do valor da indenização para esses quatro casos de ilícito depende
dos fatos. Por intrusão na privacidade de outrem, o autor pode ser
ressarcido pelo valor econômico que o réu recebeu em virtude da apropriação,
bem como por qualquer prejuízo econômico, assim como por dano moral e,
possivelmente, ter direito a indenização punitiva. Por apropriação comercial,
pode ser ressarcido por dano moral e ter direito a indenização punitiva, especialmente
se o causador do dano agiu intencionalmente, sabendo que agia
contra a vontade do autor. Sobre a ação por falsa publicidade, que se aproxima
da difamatória, aplicam-se as restrições constitucionais discutidas anteriormente,
pois a publicação necessariamente traz à baila os direitos de liberdade
de expressão. Assim, a indenização por falsa publicidade se aproxima da indenização
por difamação.
Na publicidade não razoável sobre a vida de outrem, danos morais e
danos punitivos seriam elementos próprios da indenização. No entanto, se
esses fatos da vida “privados” forem verdadeiros, e se foram obtidos sem o uso
de meios impróprios, isto é, não foram obtidos através de fraude, crime, invasão,
ou quebra de confiança — é praticamente certo que a Primeira Emenda
sobre proteção da liberdade de expressão/liberdade de imprensa se aplicaria.
Quão substanciais têm sido as indenizações por difamação ou invasão de
privacidade provocadas pela mídia?
Às vezes foram substanciais, mas isso não é uma ocorrência comum. Até
recentemente, a indenização de caráter punitivo representava sempre a maior
parte da indenização concedida. Num caso famoso, julgado em 1997, pelo
Tribunal Federal da Carolina do Norte, Food Lion vs. Capital Cities/ABC,
Inc., uma rede de supermercados processou uma rede nacional de televisão
depois que ela mandou repórteres se tornarem empregados no supermercado
e, secretamente, filmar a maneira como as carnes eram embaladas. O filme,
levado ao ar, mostrou que, em alguns casos, carnes sem condições sanitárias
estavam sendo vendidas. Por vários motivos, a rede de supermercados não
processou a televisão por difamação, mas por fraude, invasão e quebra de
lealdade de funcionários. A indenização material provada foi de apenas US$
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1.402. O júri concedeu tal quantia, mas depois fixou a indenização em mais
de US$ 5.5 milhões. Essa quantia foi drasticamente reduzida pelo juiz, depois
do julgamento, para US$ 315.000; isto é, ainda um valor substancial
em relação aos danos materiais sustentados. No recurso, o Tribunal Federal de
Apelação, por várias razões, modificou grande parte da sentença e fixou o
valor de somente US$ 2 pela invasão e quebra do dever de lealdade.
Ainda assim, houve muitos comentários sobre o efeito impactante da
indenização fixada na primeira sentença. Até hoje, o debate a respeito continua.
Entretanto, um caso muito importante, julgado pela Suprema Corte
americana há alguns meses, está apto a colocar toda essa discussão sob outro
enfoque. No caso State Farm Automobile Insurance Company vs. Campbell, que
não foi um caso de difamação envolvendo a mídia, mas sim, de má-fé e
fraude por parte de uma companhia de seguros, o tribunal decidiu que o
devido processo legal requeria que a indenização de caráter punitivo tivesse
uma relação razoável com a indenização por dano material ou real, e que a
indenização punitiva que ultrapassasse a proporção de um dígito em relação
à indenização por dano material (isto é, 9:1), raramente, seria considerada
constitucional. De fato, quando a indenização por danos materiais e “substancial”,
disse o tribunal, a indenização punitiva “talvez somente igual à compensatória
(isto é, por danos materiais), pode atingir o limite máximo da garantia
do devido processo legal”.
Essa decisão certamente terá um impacto importante nos casos futuros
de difamação e responsabilidade civil contra a mídia. Indica que, quando o
valor da indenização por dano material é limitado, o valor da indenização
punitiva também o será. Tal princípio ainda não foi usado em casos de difamação
envolvendo a mídia, mas certamente será usado em breve.
5) Finalizando, qual o grau de facilidade que a mídia tem
5) para obter informações do Judiciário?
Há uma forte presunção de que os tribunais e os processos estão abertos
a todos, incluindo, claro, a mídia.
No geral, os processos podem ser examinados pelo público através dos
autos de processo ou, mais recentemente, em vários tribunais, através da forma
eletrônica. A parte que quiser ter acesso, obviamente terá que pagar pelas
cópias do processo. No entanto, um número limitado de casos pode estar sob
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sigilo. Num caso criminal, por exemplo, se o acusado se declara culpado e
também coopera como testemunha para o governo, pelo menos até o julgamento
de mérito, esse é um fato que não deve ser publicamente declarado.
Neste caso, o processo estará sob sigilo. Da mesma maneira, num caso cível,
os segredos comerciais de uma das partes envolvidas seria uma das razões para
colocar sob sigilo uma parte, ou todo o processo.
Audiências de julgamento, bem como Tribunais do Júri (embora não
necessariamente audiências de instrução), também são considerados como
abertos ao público. Qualquer coisa dita nesses procedimentos é, obviamente,
uma notícia que pode ser publicada. Aqui também há, no entanto, certas
circunstâncias em que o procedimento pode ser fechado ao público. Se puder
ser estabelecido que há um interesse prevalecente em fechar uma audiência de
julgamento ou um Tribunal do Júri, um eventual fechamento pode ser constitucional.
Assim, no caso de um processo ter a colaboração de uma testemunha
cuja identidade o governo queira preservar enquanto processa co-autores,
o procedimento pode ser fechado. Da mesma maneira, um julgamento pode
ser fechado por motivos de segurança nacional, como no caso envolvendo o
ataque a bomba ao World Trade Center, em 1993, em Nova York. Um julgamento
penal envolvendo um menor de idade também pode ser fechado, embora
até esse tipo de julgamento venha sendo reconsiderado em várias cortes.
Mas, de forma geral, os procedimentos são abertos ao público. Aliás, se a
mídia for contra o fechamento do procedimento, ela tem legitimidade para
contestar a decisão da corte, e apelar, se necessário.
Naturalmente há limites ao que o público, incluindo a mídia, pode fazer
no transcorrer de um processo. A mídia não está autorizada a examinar independentemente
as provas, isto é, a arma, as drogas, as fotos — enquanto o
julgamento estiver ocorrendo.
Mas, e quanto a trazer as câmeras de televisão para a sala de audiência?
Esse é um assunto intensamente debatido atualmente nos Estados Unidos.
Na esfera federal, cada um dos treze Tribunais de Apelação, pode decidir se o
permite ou não, mas as câmeras são proibidas nos 94 Tribunais Distritais
(Juízos de Primeira Instância). Na esfera estadual, alguns permitem câmeras
em todos os níveis, incluindo a primeira instância. Tanto os defensores quanto
os opositores das câmeras freqüentemente citam o caso O.J. Simpson em
seu favor. Os opositores alegam que a existência de câmeras afeta o decoro nos
procedimentos, enquanto os defensores dizem que o público tem a oportunidade
de testemunhar os casos de interesse da comunidade ou da nação. O
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assunto das câmeras nas salas de audiência tem sido constantemente discutido,
e parece que, no futuro, elas estarão mais presentes que nos dias de hoje.
Uma questão certamente permanecerá constante. A imprensa não pode
ser impedida de publicar o que quiser sobre o andamento de um procedimento
judicial. Por outro lado, limites podem ser impostos ao que os litigantes
e seus advogados podem dizer. Ocasionalmente, ordens restritivas são impostas
nos julgamentos a fim de evitar que as partes e seus advogados tentem
influenciar a mídia e, conseqüentemente, os jurados que estão decidindo o
caso. Ao mesmo tempo, embora o tribunal não possa barrar a entrada da
mídia ou controlar o que é publicado, ele pode, no caso da cobertura da
mídia estar se tornando sensacionalista, transferir o julgamento para outro
local, onde a publicidade seja menor. Isso aconteceu recentemente no caso
envolvendo réus alegadamente envolvidos em atirar seguidamente em civis na
área de Washington, D.C., Maryland. O julgamento foi transferido para uma
pequena cidade da Virgínia.
Finalmente, temos a questão do acesso público às informações dos tribunais.
Praticamente todos os tribunais, federais e estaduais, publicam estatísticas
anuais e tornam disponíveis à imprensa cópias de suas políticas e de seus
procedimentos. Não há, no entanto, nenhuma disposição na Lei de Liberdade
de Informação Federal (Freedom of Information Act) que obrigue o Judiciário
federal a fornecer inúmeros tipos de informações a que a maioria das agências
executivas federais está obrigada. A lei, expressamente, exclui os Tribunais
Federais de tal obrigação.
Os Estados que têm sua própria legislação sobre liberdade de informação
também excluem seus Judiciários de tal obrigação.
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fonte: http://www.epm.org.br/

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